quinta-feira, 29 de setembro de 2011



Primeiro ensaio – Avenida Brasília Formosa, de Gabriel Mascaro

por Fábio Figueiredo

Avenida Brasilia Formosa, documentário dirigido pelo pernambucano Gabriel Mascaro, traz à tona histórias de personagens que têm as suas vidas ligadas ao bairro de Brasília Teimosa, na zona sul do Recife. Mas apesar da localização, o bairro, na verdade, é uma área de ocupação urbana, que acabou se transformando em uma favela a beira mar. A vida rotineira e estabelecida da população é afetada quando as palatifas da orla são desocupadas para dar lugar à construção da Avenida Brasília Formosa.

Em meio a essas transformações, o documentário é construído tendo como pilares quatro curiosos personagens. Fábio, o primeiro deles, é um jovem trabalhador, que consegue dividir o seu tempo para garantir o seu sustento e, porque não, tentar se divertir. Ele é garçom em um restaurante na praia e videomaker nas horas vagas. Além disso, ainda arruma tempo para ser um tipo de coreógrafo na igreja. Fábio não teve que se mudar de Brasília Teimosa por conta da construção da avenida, assim como o segundo personagem: o menino Cauã. Horas se comportando como uma criança normal, agitada, alegre, outrora agindo de forma estranha e reprimida, o menino vive com os pais. O videomaker Fábio, em certa altura do filme, é o responsável por registrar o aniversário de cinco anos do pequeno Cauã. O mesmo Fábio que também é contratado pela divertida manicure Débora, que tem o grande sonho de ser escolhida para participar do Big Brother. Dona de seu salão de beleza na comunidade, Débora é o terceiro personagem de destaque no filme, e mostra que apesar da vida limitada na favela, é possível ser feliz. Débora se acha super bonita, vai à praia com as amigas para paquerar e tomar sua cervejinha, e curte um bom samba no fim de semana. Mais distante destas vidas mais agitadas está o quarto personagem da trama: o pacato pescador “Pirambú”. Este sim, precisou se mudar devido à chegada da nova avenida, e foi transferido para um conjunto habitacional, mais distante do mar. Ruim para Pirambú, que tem todo o seu sustento ligado à sua atividade de pesca, e agora precisa da sua bicicleta para se locomover.


Apresentados os personagens, o filme constrói, em minha opinião, uma rede de histórias brilhante. Para tanto, além das imagens produzidas para o documentário, o diretor também utiliza imagens “caseiras” feitas por Fábio. De uma forma ou de outra, todos os personagens acabam sendo contemplados tanto pelos registros “profissionais” quanto pelos “amadores”. Boas histórias que tem em comum as idas e vindas pela nova avenida, que mesmo sem vida, acaba sendo a personagem principal da história. O início desta mudança, por exemplo, é retratado através de imagens registradas por Fábio, que mostram a visita do então presidente Lula às casas suspensas na orla de Brasília Teimosa. Anos depois, ali estavam todos, após a construção da Avenida Brasília Formosa, que “cortou” a favela ao meio.

Interessante na trama é perceber que não existe uma história com começo, meio e fim. Apesar de algumas cenas passarem a impressão de uma coisa roteirizada previamente, na maioria delas não é possível identificar uma consciência dos personagens em relação ao registro. As cenas, muitas vezes são longas, sem cortes, provocando uma imersão de quem as assiste, movidas pela curiosidade em saber onde aquilo tudo vai acabar. O começo já nos dá uma ideia do que o filme pretende fazer. Pirambú aparece tecendo a sua rede de pesca, estranhamente em meio a edifícios, sem a areia da praia, sem barulho do mar... Assim como a rede de Pirambú, o cineasta Gabriel também procura tecer a sua, mesmo que às vezes elementos desconexos apareçam para deixar uma possível construção lógica mais complicada de ser feita. Avenida Brasília Formosa é mais que uma via de transporte. É também uma via de histórias, encontros e mais que tudo, uma via de ligação capaz de unir personagens simples, mas com uma riqueza de valores incrível.

Nenhum comentário:

Postar um comentário